09-09-2014: Organizações Comunitarias: O desafio – Costa Rica


Organizações comunitárias tem grandes desafios a superar. Não é fácil conciliar os objetivos, sonhos e ideias de um grupo de pessoas que, apesar de viverem no mesmo lugar e em situação semelhante, não pensam exatamente da mesma maneira. Mesmo que todos tenham o desejo comum de mudar suas condições de vida.

São problemas às vezes complicados de se solucionar, como a falta de participação e envolvimento de alguns membros. Isso é justificado muitas vezes pela necessidade imediata de trabalhar pela sobrevivência, mas às vezes também pela dificuldade em acreditar que as coisas possam ser diferentes.

O mundo que nos rodeia tenta nos convencer todos os dias que as coisas são muito difíceis de mudar e de não há nada que podemos fazer. Não somos incentivados a acreditar no nosso próprio poder de transformar nossa realidade e o mundo à nossa volta. Vemos sempre na ficção heróis “escolhidos” para salvar o mundo.  Somos levados a acreditar que os grandes ícones de mudança social como Gandhi, Madre Tereza, Martin Luther King e etc são pessoas muito distantes do normal, que já nasceram com aquele destino traçado e que não tiveram dúvidas, não foram desacreditados e não tiveram que se esforçar para conquistar o que conquistaram.

A verdade é que o caminho não é fácil, mas que com dedicação e perseverança, um pequeno grupo de pessoas que se reúne em uma comunidade para mudar as coisas, pode provocar mudanças profundas em suas vidas e seu entorno.

Ao chegar à El Progreso de Drake, conheci a pequena ACOTPRO, que tem um nome grande: Asociación Conservacionista para la Protección de la Tortuga Marina del Progreso.

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Thays com os sócios da ACOTPRO

Essa organização comunitária reúne um grupo de pessoas da zona rural da Costa Rica, numa das áreas com maior diversidade no país. A região ainda está preservada mesmo com toda a especulação imobiliária hoteleira que acomete essa pequena nação da América Central.

Apresentei no último post o que é o trabalho da ACOTPRO, que nasceu da Fundação Corcovado para empoderar a comunidade local a administrar o projeto de conservação ambiental desta zona da Península de Osa. O que eu vi a primeira vista foi um grupo de pessoas desacreditadas na organização, muita desconfiança entre os membros e a junta diretiva, um déficit financeiro e ainda uma dose de desânimo. Para complicar a situação, a organização estava prestes a assumir o total controle do projeto de conservação de tartarugas marinhas, mas sem muita ideia de como fazê-lo. Confesso que logo de cara desconfiei que eu poderia ajudar de alguma maneira para que eles trabalhassem todas essas questões e dessem uma reviravolta na situação.

Porém, ao final das semanas que passei com eles nessa pequena comunidade rural, saí de El Progreso de Drake com a sensação de missão cumprida! Não resolvemos todos os problemas nem fizemos milagres, mas pudemos trabalhar várias questões importantes, aprender juntos e planejar ações para o futuro.

Workshop com ACOTPRO

Workshop com ACOTPRO

Enquanto isso, o Carson trabalhava na parte de infra-estrutura, auxiliando o Rob da Fundação Corcovado a terminar os últimos ajustes para a inauguração do hostel que funcionará como uma fonte de renda para os projetos ambientais da Fundação Corcovado.

Eu me dediquei nos primeiros dias a entender melhor a situação da ACOTPRO e conhecer mais a opinião de cada um dos membros sobre o que estava bem, o que estava mal e quais deveriam ser as prioridades para nosso trabalho. Foram uma série de entrevistas individuais e algumas reuniões coletivas, até que definimos os principais temas de trabalho: administração, gestão financeira, recrutamento e coordenação de voluntários.

Para trabalhar todos esses assuntos, nos reuníamos em sessões de discussão e os resultados foram incríveis. Em sessões de Brainstorming, definimos todas as ações que os membros deveriam desenvolver para atrair os voluntários, peças essenciais para o projeto. Eu pude auxiliá-los nessa parte construindo um site em uma plataforma gratuita e que eles mesmos podem atualizar sempre sem necessidade de intermediários. Recomendo essa plataforma a todas as pessoas inexperientes e sem recursos que precisam de um site: www.weebly.com

Membros da ACOTPRO fazendo um relatório financeiro

Membros da ACOTPRO fazendo um relatório financeiro

Tivemos algumas reuniões para conversar abertamente sobre os problemas que os sócios viam na organização. Aprendi durante a expedição que essas oportunidades de discutir sobre os problemas com a ajuda de um facilitador externo é um importante passo no caminho da resolução dos mesmos. Os socios puderam falar sobre a insatisfação (e desconfiança) em relação ao controle financeiro; sobre a falta de participação dos membros da comunidade e discutir as razões para isso; discutir a realização de eleições para uma nova junta diretiva e outras questões que afetam o funcionamento da associação e dos projetos que realiza.

Foram dias de muito trabalho, onde pudemos discutir os pontos importantes que organizações sem fins lucrativos devem ter sempre bem organizados, como é o caso da parte financeira. Fizemos alguns workshops para aprender a controlar a contabilidade e a escrever relatórios financeiros. Estes garantem a transparência essencial às organizações comunitárias. Na verdade, descobrimos que o grande problema existente na área financeira era por falta de saber administrar o dinheiro.

Um dos maiores desafios desse tipo de organizações é que falta o conhecimento técnico. Empresas e organizações maiores tem a possibilidade de contratar mão de obra especializada, mas um grupo de agricultores que não possui nem computadores precisa receber treinamento para auxiliar nessas questões. Porque apesar de alguns não acreditarem em sua capacidade, as pessoas são sim capazes de aprender essas novas habilidades e administrar seus projetos!

Algumas semanas após deixarmos a Costa Rica recebi uma mensagem do Rob, da Fundação Corcovado, em que ele me contava que os socios da ACOTPRO haviam começado a arrumar o pequeno escritório que nunca haviam utilizado. Ele queria me contar que o impacto que eu fui capaz de produzir neles foi bem grande. E qual era o objetivo da Expedição desde o princípio? Atuar como catalizadores do desenvolvimento e compartilhar conhecimento para que pequenas organizações possam se fortalecer e seguir adiante, fortalecidas e mais eficazes na luta pelos seus objetivos!

O carinho imenso que recebi dessas pessoas, a alegria de poderem estar aprendendo coisas novas e a gratidão por minha visita tocaram o meu coração. Mal sabem eles que a experiência foi também de grande aprendizado para mim.  Saí da ACOTPRO entendendo melhor e admirando ainda mais o trabalho de organizações comunitárias. Com respeito ainda maior por seus membros que, apesar das incontáveis dificuldades, não desistem de seus sonhos de melhorar suas vidas, as de suas família e de suas comunidades.