20-03-2015: Chegando ao Fim do Mundo – Chile/Argentina


Um dos maiores marcos de toda a viagem era poder percorrer a América Latina desde seu extremo norte o México, até seu extremo sul a Patagônia. Como viajante inveterada, sempre tive uma queda por pontos geográficos significativos e dessa vez não seria diferente. A distância era grande, mas deveria ser percorrida para chegar a uma das regiões mais remotas do continente e a cidade mais ao sul do mundo, Ushuaia.
Saindo de Santiago, parei brevemente em Valdivia para tomar o ônibus para o sul. Valdívia era só uma parada estratégica, mas a pequena cidade me deixou com gosto de quero mais. Principalmente pelo submarino museu, parado em sua costa que não pude visitar e pelo seu interessante mercado à beira do cais que atende até leões marinhos, que comem os restos dos peixes limpos pelos vendedores.
Tomei um ônibus que viajaria por 24 horas até Coihaique, já no norte da Patagônia chilena, mas que percorreu a maioria de seu caminho do lado argentino devido à inexistência de uma rodovia do lado chileno. Na mesma viagem fizemos o procedimento de cruzar fronteiras 4 vezes e enfrentamos o desconforto da poltrona por tantas horas que os outros passageiros  se tornaram conhecidos.
Chegando em Coihaique, rumo a Puerto Ibañez, peguei um carro que leva passageiros entre as pequenas cidades da região, principalmente devido à escassez de ônibus. Nessa região, as pessoas são um pouco fechadas a princípio, mas a hospitalidade do patagón (pessoa natural da Patagônia) é famosa entre os viajantes. O motorista do carro Carlos, acabou oferecendo sua casa para que eu passasse a noite ao invés de pagar o preço caro de uma pensão. Ele não só me hospedou como compartilhou seu jantar e café da manhã comigo e ainda me levou para conhecer os atrativos da pequena e bela vila, uma cachoeira e um mirante. Claro que tive um pouco de receio em dormir assim na casa de um desconhecido mas se deixarmos o medo prevalecer, deixamos de viver momentos de valor e desfrutar do grande presente que é a generosidade das pessoas.
No dia seguinte, tomei a balsa que cruza o belíssimo lago General Carrera de  águas cristalinas rumo à Chile Chico, já na fronteira com a Argentina. Dali parti rumo a El Calafate para conhecer um dos mais belos exemplos do poder da natureza. O imponente Glaciar Perito Moreno, com sua extensão quilométrica de picos de gelo literalmente se move sobre as montanhas, para despedaçar-se em blocos enormes ao encontro do Lago Argentino, rugindo constantemente com a quebra de gelo.
Se fosse apenas até ali, a viagem até o extremo sul já haveria valido a pena, mas ainda haviam aproximadamente 1200 km para serem percorridos. Foram muitas, mas muitas horas de ônibus, carona, balsa e mais ônibus para chegar até lá, passando por Puerto Natales, Punta Arenas e Rio Gallegos; enfrentando neve, ventos de até 100 km por hora, passando por uma paisagem inóspita e habitada praticamente apenas por imensos rebanhos de ovelhinhas.
Até chegar a Ushuaia, cruzei a fronteira entre Chile e Argentina 8 vezes . Percorri 4350 km em uma semana e cheguei à latitude -55 sul.
Depois de mais de 13 meses rumando ao sul, passar por 14 países e organizações, era hora de ajustar o compasso e seguir rumo ao norte, rumo à casa. Mas claro que ainda faltavam 5700 km.